3 de outubro de 2024
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Cresce número de registros de assédio sexual em Sergipe

Advogada orienta mulheres a não se calarem. Aquelas que se encontram em situação de violência por assédio sexual, devem buscar constituir provas e denunciar, conforme alerta Valdilene Martins

A violência sexual atinge mulheres de diversas classes sociais, raças e idades no Brasil. Se trata de uma dura realidade do país e do mundo e que pode se apresentar de diversas formas, senda uma delas o assédio sexual. Há registros de assédio sexual em ambientes de trabalho e também em instituições de ensino. Em Sergipe, os números de assédio sexual crescem a cada ano. Em 2017, 27 casos foram registrados, enquanto em 2018 os números subiram para 36 e em 2019, entre janeiro a agosto, já somam 66 casos, conforme dados da Coordenadoria de Estatística e Análise Criminal (Ceacrim) da Secretaria de Segurança Pública de Sergipe (SSP/SE).

Contudo, os números mostram uma realidade parcial da questão, já que muitas mulheres são vítimas de assédio sexual em seus ambientes de trabalho ou universidades, no entanto, camuflam a situação por medo de exposição ou julgamento. Para piorar, em muitos casos de assédio sexual, quando há negativa por parte da vítima, o agressor passa então a assediar moralmente.

O assédio sexual é crime previsto na legislação penal brasileira e se constitui na violação de direitos humanos. Além de ferir a dignidade humana, violar os direitos de segurança no trabalho e a igualdade de oportunidades, também prejudica a saúde das vítimas. De acordo com a advogada Criminalista e de Família, atuante especificamente na Assistência Jurídica de mulheres em situação de violência, Valdilene Martins, a principal recomendação para todas as mulheres vítimas de assédio sexual ou moral, seja em ambiente de trabalho ou de ensino, é não se calar.

Segundo Valdilene, existe um trabalho iniciado a partir da provocação do coletivo Mulheres Livres junto ao Ministério Público Federal (MPF), com as  Instituições de Ensino Superior  do Estado de Sergipe, desde 2017. Diante do grande número de denúncias por alunas, o órgão e a organização se sentiram no direito de orientar.

“Nos relatos das alunas, elas contam que ouviam coisas como “Ah, você na minha cama”, ou “Ah, você na minha casa”, “Quer fazer prova oral comigo?”, e por aí vai. O assédio se caracteriza por um comportamento que não é isolado. Ele pode até não começar assim. Ele pode começar tranquilo, com um elogio. Mas, com o passar do tempo ele se transforma em algo degradante, para desestabilizar a pessoa psicologicamente. Pode ser falando, pode ser por gesto. E a pessoa se sente incomodada ou constrangida. Muitas mulheres já deixaram graduação, mestrado e até mesmo o doutorado por conta de assédio”, conta Valdilene.

Quando o assédio sexual é caracterizado em ambientes de trabalho a situação é ainda mais delicada, segundo afirma a advogada. Em muitos casos, com o “não” da vítima, o agressor então passa a praticar o assédio moral. “Muito assédio sexual vira moral porque com a negatória, o superior, ou quem for que esteja ali assediando, pode começar a retaliar. Essa questão no trabalho é muito mais delicada, e tem gente que até se submete, com medo de perder o emprego, literalmente. As vezes aquele superior pode perseguir a trabalhadora até fora da empresa. Um assediador que tem influência pode até inviabilizar que a vítima  seja contratada em outra empresa”, lamenta a advogada.

Por isso a importância de as mulheres vítimas de assédio sexual nunca se calarem. Principalmente quando ao redor se tem um contexto cultural machista, onde a palavra da mulher será sempre questionada. “Em crime envolvendo questões de gênero, seja ele de abuso, assédio, estupro etc, a dúvida só beneficia o criminoso e coloca em xeque a palavra da vítima. Porque para ele se defender não precisa provar que não fez. Basta colocar a palavra da mulher em dúvida. Por isso é fundamental que a mulher não se intimide”, ressalta Valdilene.

O assédio pode se configurar em várias faces, podendo ser intimidador e também acontecer independentemente da hierarquia. Até mesmo um colega do mesmo setor pode acabar praticando o crime. Além disso, a violência pode ser física ou verbal. Sem contar aqueles em que são praticados por agressores que se utilizam da chantagem, onde o assediador estabelece uma troca de favores. Para conceder um aumento ou uma promoção, por exemplo, a mulher tem que dar algo a ele.

“Eu recomendo que a mulher que passa por essas situações comece a anotar a periodicidade dos avanços e das investidas. A pessoa poderá perceber a periodicidade e começar a constituir provas. Por exemplo, chamou para conversar na sala, vai com o telefone e grava. Além de printar todas as conversas que tiver com o agressor via whatsapp. Instalar um aplicativo que grava ligações também pode ser um dos métodos para conseguir provas. Depois ela pode conversar com alguém, com outra mulher, uma amiga. Porque geralmente tem outras mulheres que já passaram por aquilo. Geralmente esse assediador é serial. Constituindo o máximo de provas, ela deve procurar ajuda. Ou o núcleo específico da instituição, ou a ouvidoria, ou corregedoria. Tendo sempre a denúncia por escrito, para que possa protocolar. E, o principal: sem ter medo de se expor. Esse medo e vergonha tem que ser do assediador. Temos que lutar pelos nossos direitos”, orienta a advogada.

Segundo a Secretaria de Segurança Pública (SSP), há pouco tempo uma mulher fez um boletim de ocorrência no Departamente de Atendimento a Grupos Vulneráveis (DAGV) onde relatou que um dia estava no estabelecimento de trabalho de segmento comercial, onde atua como caixa, lavando um prato, pois havia acabado de almoçar, quando o dono da empresa foi por trás dela e a abraçou com cunho sexual.

A vítima conta no Boletim que pediu para que o patrão a soltasse, dizendo que estava machucado a barriga, mas, mesmo assim ele só soltou quando ela começou a gritar. “Em seguida, a noticiante foi para perto do caixa, onde trabalha e contou todo o fato a uma colega. Esta vítima, assim que foi admitida para trabalhar, foi abordada pelo mesmo dono do estabelecimento dizendo que poderia ficar lá por muito tempo, caso ficasso como amante dele, sendo tal proposta recusada pela mulher. Mas, não foi prestada a ocorrência. A DAGV instaurou um procedimento policial e responsabilizou o autor, que respondeu criminalmente”, informou a SSP.

Casos como esse, quando não interrompidos, podem constituir perdas significativas às vítimas, principalmente aquelas ligadas à saúde, como consequências psicológicas, que quando não tratadas podem avançar para doenças físicas. “O assédio sexual é uma forma de assédio mais constrangedora e mais violenta, porque sugere ou busca de fato favores sexuais de um trabalhador (geralmente as vítimas são mulheres) usando alguma forma de chantagem. A situação mais comum é o chefe e superior utilizar sua função para conseguir favores sexuais. Há situações relatadas de insinuações claras. Pode acontecer de a pessoa ser apalpada em partes íntimas, ou mesmo agarrada a força e até ser consumado o ato sexual. Nesse último caso, o assédio sexual pode se tornar outros crimes, como importunação sexual e até estupro. O agressor tem que ser processado criminalmente pela vítima, nesses casos”, acrescenta a SSP.

|Reportagem: Laís de Melo

||Foto: André Moreira 

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